terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Das vantagens de ter um blog só seu:

1ª- Poder começar o post explicando que preferiria passar um dia inteiro levantando peso na academia do Big Brother, enfrentando racionamento de comida e tudo mais; a postar um texto de pseudo-intelectual da Escolinha de Frankfurt no blog. Pois é, sou uma pessoa horrível.

Mas abri uma exceção pq a FCC divulgou hoje o gabarito preliminar do concurso de Oficial de Chancelaria, cuja prova de Filosofia Português deixou absolutamente desorientada grande parte dos candidatos - eu inclusa. Mais tarde, quando me recuperar do choque, posto as outras disciplinas.

Atenção: O texto abaixo, para as questões de números 1 a 5, foi extraído de correspondência do renomado escritor norte-americano Norman Mailer endereçada ao crítico literário Peter Balbert.

1º de fevereiro de 1998

Caro Peter,

1 Entre as coisas que temos em comum está a depressão
cultural. Reflito sobre a minha vida, especialmente
depois de ter completado cinquenta anos de literatura, e
sinto que todas as coisas pelas quais trabalhei e lutei estão
5 em decadência. O que antes eu via como o inimigo e, com
grande otimismo, como o inimigo que haveria de ser
derrotado, acabou na verdade por nos vencer. [...]

A questão diante de nós dois é: onde está a culpa?
Estava em nós? Por nunca termos feito o suficiente, por
10 mais que achássemos que sim? Ou estará na abstração
que chamamos de “natureza humana”? Teremos ajustado
as nossas crenças a um conceito de homens e mulheres
que não se adequava aos fatos rasteiros?

Às vezes me pergunto se isso não será puro elitismo
15 de minha parte, e se a verdadeira premissa da democracia,
a de que os sem-banho tenham acesso a sabonete
barato, desodorante e roupas de plástico, como um dos
degraus da escalada a um nível mais alto, não seria o que
está acontecendo. Ou se, como temo, estaremos caindo
20 numa sociedade do homem e da mulher medíocres
onipresentes, governados por altas mediocridades. [...]

Tudo de bom,
Norman Mailer.

(Adaptado de Cartas Políticas, O mundo nas cordas, revista Piauí, 27, p.32)


1. A alternativa que acolhe comentário condizente com as características da carta é:

(A) Em discretos matizes, como a indicação do destinatário pelo prenome e do remetente por nome e sobrenome, insinua a existência de relação hierárquica entre o escritor e o crítico.

(B) Registra inconveniente intimidade nas saudações inicial e final, as quais, uma vez substituídas por “Prezado” e “Sem mais”, respectivamente, restituiriam ao texto a formalidade que seu tema requer.

(C) Focaliza a atuação profissional dos interlocutores, especialmente no que diz respeito aos modos como conceberam e trataram homens e mulheres ao produzirem textos literários.

(D) Por explorar temática sociocultural, ultrapassa os limites da subjetividade e transforma as queixas do remetente em afirmações categóricas acerca da necessidade de engajamento político da elite.

(E) Preservando tom subjetivo, expõe reflexões acerca do impacto de atitudes individuais sobre cenários mais amplos, revelando dupla apreensão: com específico sentimento de culpa e com o futuro da sociedade

2. A alternativa correta acerca do uso de tempos verbais na carta é:

(A) A substituição da forma Teremos (linha 11) por “Teríamos” atenuaria o valor hipotético da frase.

(B) No segundo parágrafo, a incerteza acerca do tempo, expressa pela alternância entre está, estava e estará, reforça o sentido de dúvida presente no trecho.

(C) A correlação entre as orações Reflito sobre a minha vida (linha 2) e depois de ter completado cinquenta anos de literatura (linha 3) expressa que a vida anterior ao aniversário mencionado não é objeto de meditação.

(D) O emprego da forma será (linha 14) torna o enunciado mais assertivo do que o seria se a forma escolhida fosse “é”.

(E) O segmento acabou... por nos vencer (linha 7) indica finalização recente da ação nele descrita.

3. O excerto demonstra que o autor

(A) considera-se culpado das mazelas sociais, seja por não ter agido nos momentos graves, seja por operar com crenças contraditórias e demasiadamente abstratas.

(B) compartilha com o interlocutor a sensação de estar declinando culturalmente, apesar dos diversos anos dedicados a atividade intelectual nobre.

(C) acredita ter contribuído, em outras épocas, para o real aprimoramento de homens e mulheres, posteriormente submetidos à universal mediocridade.

(D) hesita em relação à possibilidade de preceitos democráticos estarem sendo postos em prática na época em que escreve a carta.

(E) concorda com a premissa de que os desfavorecidos devam receber o necessário para a manutenção da dignidade: sabonete barato, desodorante e roupas de plástico.

4. Tendo em vista o contexto, a alternativa correta acerca de recurso linguístico explorado na carta é:

(A) Na linha 19, Ou se, por introduzir conteúdo adicional à sequência de questionamentos que inicia o parágrafo, pode ser substituído por “E, ainda, se”, preservando o sentido original.

(B) Os fragmentos por nos vencer (linha 7) e por altas mediocridades (linha 21) exercem idêntica função sintática.

(C) Na linha 10, por remeter a termos antecedentes, sim pode dar lugar a “era o suficiente”.

(D) A ordem dos termos na coordenação do homem e da mulher (linha 20) expõe restrições do autor quanto à igualdade entre os gêneros.

(E) Em O que antes eu via (linha 5) como o inimigo, os itens destacados indicam que o autor havia se equivocado em sua percepção anterior, isto é, que não se tratava de um inimigo.

5. A alternativa correta sobre expressões do texto é:

(A) O segmento com grande otimismo (linhas 5 e 6), de caráter apositivo, qualifica o termo o inimigo.

(B) Nas linhas 8 e 9, o contraste entre nós dois e nós explicita que, apenas na primeira ocorrência, o autor refere-se a si e ao seu interlocutor.

(C) As formas alto (linha 18) e altas (linha 21) têm exatamente o mesmo significado, embora ocupem posições diferentes em relação aos substantivos e correspondam a diferentes flexões do adjetivo.

(D) Reflito (linha 2) e sinto (linha 4) podem ser permutados, respectivamente, por “conscientizo-me” e “la mento”, sem prejuízo do sentido original.

(E) Quanto ao significado, crenças (linha 12) inclui abstração (linha 10) e opõe-se a fatos rasteiros (linha 13).

Atenção: As questões de números 6 a 9 referem-se ao texto que segue.

1 Humes observou certa vez que a civilização
humana como um todo subsiste porque “uma geração
não abandona de vez o palco e outra triunfa, como
acontece com as larvas e as borboletas”. Em algumas
5 guinadas da história, porém, em alguns picos críticos,
pode caber a uma geração um destino parecido com o
das larvas e borboletas. Pois o declínio do velho e o
nascimento do novo não são necessariamente
ininterruptos; entre as gerações, entre os que, por uma
10 razão ou outra, ainda pertencem ao velho e os que
pressentem a catástrofe nos próprios ossos ou já
cresceram com ela [...] está rompida a continuidade e
surge um “espaço vazio”, espécie de terra de ninguém
histórica, que só pode ser descrita em termos de “não
15 mais e ainda não”. Na Europa, essa absoluta quebra de
continuidade ocorreu durante e após a Primeira Guerra
Mundial. É essa ruptura que dá um fundo de verdade a
todo o falatório dos intelectuais, geralmente na boca dos
“reacionários”, sobre o declínio necessário da civilização
20 ocidental ou a famosa geração perdida, tornando-se,
portanto, muito mais atraente do que a banalidade do
pensamento “liberal”, que nos apresenta a alternativa de
avançar ou recuar, a qual parece tão desprovida de
sentido justamente porque ainda pressupõe uma linha
25 de continuidade sem interrupções.

(ARENDT, Hannah. “Não mais e ainda não”. In Compreender: formação, exílio e totalitarismo. Ensaios (1930- 1954). São Paulo: Companhia das Letras; Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2008, p. 187)

6. Na organização do texto, a autora

(A) refere comentário do filósofo Humes e o desconstrói, pois o desfaz para reconstruí-lo em outras bases.

(B) toma como tema certo pensamento de Humes, que detalha para convencer o leitor sobre esta compreensão que ela tem do que seja a civilização: “A natureza não dá saltos”.

(C) vale-se de Humes como argumento de autoridade, considerando irretorquível o pensamento citado.

(D) tira proveito da constatação de Humes, de caráter universal, para ratificá-la no plano mais particular que ela aborda no seu discurso.

(E) cita Humes porque a comparação que ele faz entre os homens e os animais se aplica, ipsis litteris, à concepção que ela tem acerca do que ocorre com gerações em momentos críticos.

7. Quando a autora refere-se ao “espaço vazio”,

(A) toma-o como ponto fraco do ideário “liberal”, que, equivocadamente, entende essa espécie de terra de ninguém histórica como o momento crucial para a decisão de avançar ou recuar.

(B) busca exprimir a ideia de que, mesmo diante de acontecimentos nefastos, há espaço para o acolhimento do novo, para inovadora ordem social, proposta por geração recém-surgida.

(C) caracteriza-o com expressões que deixam entrever a dificuldade que sente para conceituá-lo, dada sua natureza indefinida ou ambígua, área sobre a qual as gerações em confronto não têm controle.

(D) caracteriza-o lançando mão da história, meio de exprimir sua visão de que a ação humana, suspensa nesse oco, provocou os acontecimentos da Primeira Guerra Mundial.

(E) entende-o como ponto que legitima de modo pleno a verve dos grupos ditos “reacionários” quando defendem a necessidade do declínio da civilização ocidental.

8. Pois o declínio do velho e o nascimento do novo não são necessariamente ininterruptos; entre as gerações, entre os que, por uma razão ou outra, ainda pertencem ao velho e os que pressentem a catástrofe nos próprios ossos ou já cresceram com ela está rompida a continuidade [...]
Considerado o fragmento acima, em seu contexto, é correto afirmar:

(A) entre os que estabelece relação de estrita colateralidade entre os segmentos os que pressentem a catástrofe nos próprios ossos e [os que] já cresceram com ela.

(B) a expressão não são necessariamente ininterruptos equivale a “é prescindível que ocorram de modo contínuo”.

(C) justificam-se as duas contíguas ocorrências da preposição entre porque introduzem termos que remetem a dois aspectos, semântica e sintaticamente distintos.

(D) a conjunção ou estabelece uma relação de simultaneidade entre os dois termos que conecta.

(E) a expressão os que, em suas duas ocorrências, remete aos mesmos seres.

9. O segmento que, no contexto, exprime uma consequência é:

(A) (linhas 12 e 13) e surge um “espaço vazio”.
(B) (linhas 24 e 25) ainda pressupõe uma linha de continuidade sem interrupções.
(C) (linhas 23 e 24) a qual parece tão desprovida de sentido.
(D) (linhas 15 e 16) essa absoluta quebra de continuidade ocorreu.
(E) (linhas 14 e 15) só pode ser descrita em termos de “não mais e ainda não”.

Atenção: As questões de números 10 a 15 referem-se ao texto que segue.

1 O ataque cético à cientificidade das narrações históricas
insistiu em seu caráter subjetivo, que as assimilaria
às narrações ficcionais. As narrações históricas
não falariam da realidade, mas sim de quem as construiu.
5 Inútil objetar que um elemento construtivo está
presente em certa medida até nas chamadas ciências
“duras”: mesmo estas foram objeto de uma crítica análoga
[...]. Falemos, então, de historiografia. Que ela
[tem] um componente subjetivo [...] é sabido; mas as
10 conclusões radicais que os céticos tiraram desse dado
concreto não levaram em conta uma mudança fundamental
mencionada por Bloch nas suas reflexões metodológicas
póstumas. “Hoje [1942-3]..., até mesmo nos
testemunhos mais resolutamente voluntários”, escrevia
15 Bloch, “aquilo que o texto nos diz já não constitui o
objeto preferido de nossa atenção.” As Mémoires de
Saint-Simon ou as vidas dos santos da alta Idade Média
nos interessam (continuava Bloch) não tanto por suas
referências aos dados concretos, volta e meia inventados,
20 mas pela luz que lançam sobre a mentalidade de
quem escreveu esses textos. “Na nossa inevitável
subordinação ao passado, nós nos emancipamos, ao
menos no sentido de que, embora permanecendo condenados
a conhecê-lo exclusivamente com base em
25 seus rastros, conseguimos, todavia, saber bem mais a
seu respeito do que ele resolvera nos dar a conhecer”.
E concluía: “Olhando bem, trata-se de uma grande revanche
da inteligência sobre o mero dado concreto”.

(GINZBURG, Carlo. O fio e os rastros: verdadeiro, falso, fictício (Introdução). São Paulo: Companhia das Letras, 2007, p. 9)

10. É correta paráfrase do primeiro período do texto − O ataque cético à cientificidade das narrações históricas insistiu em seu caráter subjetivo, que as assimilaria às narrações ficcionais. − o que se lê em:

(A) O que sempre se enfatizou como determinante de um texto é o seu cunho particular, fator de subjetividade que sempre irmanou os relatos, os científicos (como os históricos) e os ficcionais (inventados pelo autor), como reconhecem até os mais severos ataques.

(B) A credulidade abalada gerou ataques ao cientificismo característico da história, e, quando se insistiu em que deveria assumir o viés subjetivo, suas semelhanças com as narrativas ficcionais avultaram.

(C) O ceticismo que nutre a ciência dá às narrativas, inclusive às de cunho histórico, um matiz subjetivo, o que foi apontado pelos críticos como um fator inerente a qualquer tipo de relato.

(D) O que caracteriza o relato de fatos históricos é sua natureza científica; se esse traço fosse minimizado e abrisse espaço para a subjetividade − dizem certos críticos −, esse tipo de relato estaria próximo das narrativas ficcionais.

(E) A acusação dos que não acreditavam no caráter científico das narrações históricas enfatizava o seu caráter subjetivo, traço que as tornaria semelhantes às narrações ficcionais.

11. É correto afirmar que, no excerto,

(A) o enunciado “aquilo que o texto nos diz já não constitui o objeto preferido de nossa atenção” (linhas 15 e 16) contém pressuposto introduzido pelo advérbio já.

(B) o autor deixa que o leitor tenha acesso à voz de Saint-Simon, ao lado da sua própria e da de Bloch.

(C) as ideias de Bloch vêm exclusivamente incorporadas à voz de Carlo Ginzburg, que não permite ao leitor entrar em contato direto com as formulações do estudioso que ele cita.

(D) o enunciado Falemos, então, de historiografia (linha 8) revela que o autor, por carência de um único argumento que seja, não ousa debater em outro campo que não o da história.

(E) o enunciado Que ela tem um componente subjetivo é sabido (linhas 8 e 9) é exemplo de frase truncada, em que faltam elementos sintáticos essenciais à expressão de um sentido completo, só apreensível com o apoio do contexto.

12. Considerada a totalidade do excerto, é correto afirmar:

(A) (linhas 7 e 8) A referência a uma crítica análoga impõe que se entenda o emprego das aspas, em “duras”, como indicador de tom pejorativo.

(B) (linha 4) O emprego do verbo “falar” no tempo e modo adotados sinaliza que o entendimento sobre a natureza da história expresso na frase deve ser atribuído aos que desferiram o citado ataque (linha 1).

(C) (linhas 4 e 5) Escrevendo de outro modo a frase mas sim de quem as construiu, o sentido e a correção originais estarão preservados se a nova formulação for “mas sim daqueles que a construíram”.

(D) (linhas 3 e 4) Na frase As narrações históricas não falariam da realidade está implícita a ideia de que a história deveria rever o viés metodológico tradicionalmente adotado.

(E) (linha 5) A expressão um elemento construtivo remete à ideia de cientificidade referida anteriormente (linha 1).

13. A expressão que está corretamente entendida, considerada a situação de uso no excerto, é:

(A) (linhas 27 e 28) grande revanche da inteligência / descomedida vingança da perspicácia.

(B) (linha 5) Inútil objetar / é desaconselhável admitir.

(C) (linhas 12 e 13) reflexões metodológicas póstumas / confissões de erros de método legadas aos pósteros.

(D) (linha 14) testemunhos mais resolutamente voluntários / depoimentos rigorosamente fortuitos.

(E) (linhas 21 e 22) Na nossa inevitável subordinação ao passado / Na sujeição ao passado, à qual não podemos nos furtar.

14. “Na nossa inevitável subordinação ao passado, nós nos emancipamos, ao menos no sentido de que, embora permanecendo condenados a conhecê-lo exclusivamente com base em seus rastros, conseguimos, todavia, saber bem mais a seu respeito do que ele resolvera nos dar a conhecer”.
Ao desenvolver suas ideias no período acima, o autor

(A) adotou o tempo e modo presentes na forma verbal resolvera porque considerou eventual o fato expresso.

(B) utilizou a expressão no sentido de com o mesmo valor observável na frase “No sentido de ajudá-lo, propus ampliar o prazo do contrato”.

(C) cometeu um deslize quanto ao padrão culto escrito, que exige o emprego de uma vírgula depois da palavra respeito.

(D) se valeu de uma proposição paradoxal (“Na nossa inevitável subordinação ao passado, nós nos emancipamos...”) e, na argumentação, minimizou a contradição entre as ideias que a constituem.

(E) empregou o pronome “o” (em conhecê-lo) porque se referia a passado; se estivesse se referindo a uma pessoa, o padrão culto escrito exigiria o “lhe” (“conhecer- lhe”).

15. Considere as afirmações abaixo.

I. A mudança fundamental citada refere-se ao fato de que a historiografia acabou adotando uma perspectiva oblíqua no seu modo de conhecimento: passou a considerar como mais significativo para a apreensão de uma época não o que uma possível testemunha conscientemente informe sobre “dados concretos”, mas aquilo que seu modo de contar possa deixar entrever, até mesmo à sua revelia, sobre o espírito que concebeu tal relato.

II. Na exposição do seu raciocínio, o autor da frase final do excerto faz uso da expressão Olhando bem (linha 27) para chamar a atenção sobre ideia que corrige outra anteriormente enunciada por ele.

III. O autor julgou necessário interferir no discurso alheio por meio dos colchetes, na linha 9, para direcionar a leitura, oferecendo ponto de referência pedido pelo advérbio Hoje, que remete ao momento em que um dado locutor está elaborando seu discurso.

Está correto o que se afirma em
(A) I e III, somente.
(B) I, somente.
(C) I e II, somente.
(D) II, somente.
(E) I, II e III.

Atenção: As questões de números 16 e 17 referem-se ao texto que segue.

Nas diversas épocas da história, a colonização assumiu formas que podem ter sido diferentes, mas que também se superpuseram umas às outras. Dominar outros povos foi de fato o motor da expansão, qualquer que tenha sido o motivo declarado desse “imperialismo”, religioso no tempo dos árabes, religioso ainda nas expedições cristãs contra os infiéis, religioso mais uma vez quando católicos e protestantes desejam consolidar a expansão de sua fé, nos séculos XVI e XVII.

O interesse político pôde ser o companheiro de todas essas formas de cruzadas. [...] O interesse econômico surge bem antes da denominada era imperialista, e afirma-se sobretudo quando, com os Atos de Navegação (1651), a expansão ultramarina é considerada um monopólio de toda a nação inglesa − e não apenas o interesse de seus comerciantes.

(FERRO, Marc. História das colonizações: das conquistas às independências – séculos XIII a XX. São Paulo: Companhia das Letras, 1996)

16. O fragmento acima está sintetizado de maneira clara e correta em:

(A) O domínio dos outros povos gerou a expansão da colonização que variou de forma, inclusive superpondo causas: das diferentes religiões, que o poder político acompanhou até o surgimento do interesse econômico, em 1651, quando a navegação, direito dos comerciantes, passou a ser da Inglaterra.

(B) A colonização − fruto, efetivamente, do desejo de domínio − realizou-se de maneiras possivelmente distintas, mas também associadas: apresentou-se, em muitos momentos, sob o signo da religião, convivendo com a motivação política; a motivação econômica firma-se no século XVII, quando a expansão ultramarina considerada privilégio de toda uma nação (a inglesa).

(C) É passível que as colonizações sejam diferentes, mas se entrelacem, pois seu objetivo é igual − dominar povos; o imperialismo religioso dos árabes, dos católicos e protestantes, companheiro dos interesses político e econômico posterior a 1651, antes da “era imperialista”, acaba no monopólio com a Inglaterra sobre a expansão ultramarina.

(D) A colonização, como a história mostra, é uma forma de cruzada, assumida de modo semelhante em alguns momentos − como no caso das várias religiões −, mas sempre significando domínio de outros povos;
as expedições religiosas conviveram bem com o jogo político das nações, e que tardou com os interesses econômicos: estes dependeram da chegada de 1651 para surgir com vigor, sob o domínio inglês.

(E) Alternando, a colonização foi, nas etapas históricas, assumindo procedimentos distintos e camuflando a sua verdadeira causa: várias vezes de ordem religiosa, outra política e outra econômica; esta é resultado dos interesses que passaram dos comerciantes para a nação inglesa como um todo, antes de surgir o imperialismo propriamente dito.

17. O segmento do texto que, transformado, mantém-se em consonância com o padrão culto escrito é:

(A) quando desejam consolidar a expansão de sua fé, grupos religiosos distintos degladiam-se um contra o outro.

(B) surge quando mau se havia cumprido os primeiros cinquenta anos do século XVII.

(C) formas acerca de cuja eficácia ninguém tem dúvida.

(D) reações a domínio, em sua também diversidade, igualmente se superpõe uns à outros.

(E) quaisquer que, naquele momento, possa terem sido as razões.

18. A frase estruturada de maneira clara e em total conformidade com o padrão culto escrito é:

(A) Não tinham sequer levantado hipótese de que fosse feito, e pelo coordenador, reparos ao texto definitivo, e ainda mais extemporaneamente, inclusive porque tinham havido já muitos comentários positivos para o grupo, vindos de renomado especialista.

(B) A discussão sobre questões pertinentes aos vários temas dos grupos inscritos demandaram muita organização, que ninguém questionou porque se fazia necessário, tendo em vista que a reflexão necessita, e se deu, com serenidade.

(C) Entre tais e tão tristes casos reportados nos jornais de hoje como as enchentes, os desastres rodoviários e os regimes de excessão, o que mais me comoveu foi de ter lido sobre a falta de assistência a desprotegidos.

(D) Eles estavam ali conversando sei lá de quê; não certamente de dinheiro, como alguns imaginaram, ainda que falassem de “títulos”; mas não existem só títulos “bancários”, também os há acadêmicos, como cheguei a comentar com os mexeriqueiros.

(E) Já tinha muito porque se atormentar, por isso tentava esquecer, e o fazia com muita persistência, das notícias que pareciam ter chegado a pouco, mas já eram conhecidas por todos.

Atenção: As questões de números 19 a 25 referem-se ao texto que segue.

Caracterização de Walter Benjamin

1 O nome do filósofo, que acabou com sua própria
vida durante a fuga ante os esbirros de Hitler, foi
ganhando uma aura nos mais de vinte anos que desde
então transcorreram, e isso apesar do caráter esotérico
5 dos seus primeiros trabalhos e fragmentário dos
últimos. A fascinação de sua pessoa e oeuvre só
deixou a alternativa da magnética atração ou da
rejeição horrorizada. Sob o olhar de suas palavras –
onde quer que ele caísse −, tudo se metamorfoseava,
10 como se tivesse se tornado radioativo. A capacidade
de incessantemente projetar novos aspectos − não
tanto mediante a ruptura crítica de convenções quanto
pela maneira, dada pela organização intrínseca, de se
comportar em relação ao objeto, como se as
15 convenções não tivessem poder sobre ele −
dificilmente conseguirá também ser captada pelo
conceito de originalidade. Nenhuma das intuições
desse pensador inesgotável apresentava-se como
mera intuição. O sujeito, a quem pessoalmente cabiam
20 todas as experiências fundantes que a filosofia oficial
contemporânea apenas discute de modo formal,
parecia ao mesmo tempo não ter nenhuma
participação nelas, mesmo porque a sua maneira,
sobretudo a arte da formulação instantânea − definitiva
25 −, também se despojou do que, no sentido tradicional −
é espontâneo e esfuziante. Ele não dava a impressão
de ser alguém que criava a verdade ou a adquiria ao
pensar, mas de que a citava pelo pensamento como
um refinado instrumento de conhecimento, no qual
30 imprimia a sua marca.

(ADORNO, Theodor. Caracterização de Walter Benjamin. Prismas: crítica cultural e sociedade. São
Paulo: Ática, 2001, p. 223-224) Obs.: oeuvre: obra.

19. É correto afirmar que o autor do excerto

(A) atribui força transformadora ao modo como o filósofo concebia e expressava seus pensamentos.

(B) julga o refinado pensamento do filósofo não como original ou espontâneo, mas como verdadeiro.

(C) oferece precisa caracterização do filósofo e de sua obra, valendo-se de conceitos que lhes são aplicáveis com justeza.

(D) expõe os artifícios formais de que se valeu o filósofo para, apropriando-se dos achados da tradição, requisitar autenticidade para seu trabalho.

(E) aponta inconsistência nas formulações do filósofo, que, pouco amadurecidas mas perenes, se despegaram do necessário aporte empírico da filosofia.

20. O nome do filósofo, que acabou com sua própria vida durante a fuga ante os esbirros de Hitler, foi ganhando uma aura nos mais de vinte anos que desde então transcorreram, e isso apesar do caráter esotérico dos seus primeiros trabalhos e fragmentário dos últimos.
Considerado o período acima, em seu contexto, é correto afirmar:

(A) Substituindo “transcorrer” por “se passar”, a frase mantém a correção gramatical com a forma “se passou”.

(B) O título do texto é determinante para que a frase que acabou com sua própria vida tenha valor explicativo, e não restritivo.

(C) A reflexividade observada no segmento acabou com sua própria vida é exatamente do mesmo tipo da encontrada em “Machucaram-se muito com as ofensas recíprocas”.

(D) A presença da preposição durante contamina a frase articulada em torno do verbo “acabar”, conferindo-lhe aspecto durativo e frequentativo.

(E) A preposição ante tem mesmo valor do segmento grifado em “antiamericano”.

21. O excerto autoriza a seguinte afirmação:

(A) as constantes inovações do filósofo acompanharam-se de desveladas críticas às convenções vigentes.

(B) o filósofo e sua obra adquiriram, com o tempo, unânime aprovação, atribuível à comoção gerada por seu suicídio.

(C) a natureza dos trabalhos iniciais e finais do filósofo não obscurece sua personalidade e sua obra, impactantes sob qualquer julgamento.

(D) a infinidade de novos aspectos inseridos nas análises do filósofo tornou-as tão herméticas que não podem ser captadas por espíritos menos originais.

(E) as inéditas ideias do filósofo devem ser creditadas aos seus métodos, fundamentados em experiências da filosofia oficial.

22. É correto afirmar que, na obra de Benjamin,

(A) o sujeito é destituído da função central que tinha na filosofia anterior, na medida em que esse filósofo opta por não se fazer notar em seus escritos.

(B) a verdade é apenas tangenciada, já que o filósofo cita concepções já aceitas como inquestionáveis, mas não ousa nelas interferir.

(C) o diálogo com a filosofia oficial engendra-se na arte da formulação instantânea, que pressupõe o descarte de conceitos tradicionais.

(D) o modo de presença da intuição gera uma subjetividade da qual emerge não o espontâneo, mas o particular.

(E) a originalidade do pensamento, derivada da organização que lhe é intrínseca, carece de vivacidade e autenticidade, tal como as entendemos.

23. Considerado o contexto, é correto o que se afirma em:

(A) A expressão ao pensar (linhas 27 e 28) traduz uma condição.

(B) O emprego de só, na linha 6, traz implícita uma ideia de exclusão.

(C) O advérbio mesmo, em mesmo porque (linha 23), introduz retificação acerca do afirmado anteriormente.

(D) Em onde quer que ele caísse (linha 9), onde está empregado em conformidade com o padrão culto escrito, assim como o está em: “Se ele insistir, é onde direi que tenho dele as piores impressões”.

(E) Ao acolherem termo sinônimo de formulação instantânea, sem nada lhe acrescentar, os travessões (linhas 24 e 25) justificam-se como recurso para dar ênfase à expressão que caracteriza a arte (linha 24).

24. O nome do filósofo [...] foi ganhando uma aura [...], apesar do caráter esotérico dos seus primeiros trabalhos e fragmentário dos últimos.
Em redação clara e totalmente em concordância com o padrão culto escrito, o sentido da frase acima está preservado em:

(A) Foi ganhando uma aura o filósofo, que já tinha nome, ainda que seus trabalhos sejam de caráter esotérico e fragmentário, respectivamente os primeiros e últimos.

(B) Ainda que os primeiros trabalhos do filósofo padecessem de caráter esotérico e os últimos fragmentários, seu nome foi ganhando uma aura.

(C) Embora se considerem o caráter esotérico e fragmentário dos primeiros e últimos trabalhos, seu nome de filósofo foi recebendo aura.

(D) A despeito de os primeiros trabalhos do filósofo terem caráter esotérico e os últimos, fragmentário, seu nome foi ganhando uma aura.

(E) Seu nome de filósofo foi ganhando aura mesmo sendo esotérico nos primeiros trabalhos, e tendo caráter fragmentário nos últimos.

25. O segmento do texto que está corretamente entendido é:

(A) como se tivesse se tornado radioativo / à semelhança de algo que adquirisse propriedade de emanar energia.

(B) fascinação de sua pessoa e oeuvre / forte encantamento que elidia criador e criatura.

(C) magnética atração / fascínio emitido de forças internas inexploradas.

(D) rejeição horrorizada / desdém que provoca pânico coletivo.

(E) tudo se metamorfoseava / o entorno adquiria formas que se sucediam ininterruptamente.


VER GABARITO.

4 comentários:

  1. Hmm, "texto de pseudo-intelectual da Escolinha de Frankfurt"... que bom que você é preparada o suficiente para julgar e separar o pseudo-intelectual do vedadeiramente intelectual; que pena que uma prova simples da burocracia estatal brasileira não faça juz ao seu brilho.

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  2. Rafael, sério que vc achou simples? Por favor, comente o gabarito das 25 questões pra gente. xx

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  3. huahauhauah... se fu..., Rafael!!! Não comentou nem uma sequer... kkkkk... Parabéns, Tati!

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